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Os ‘navios fantasmas’ de Putin que abastecem o Brasil com combustível russo

05 SET 2025

Foto: BBC News Brasil

Investigação da BBC News Brasil, conduzida por Prazeres Leandro ao longo de quatro meses, revelou que navios da chamada “frota fantasma” da Rússia continuam abastecendo o Brasil com combustíveis mesmo após as sanções impostas por Estados Unidos, União Europeia e Reino Unido contra Moscou, em resposta à guerra na Ucrânia.

O que é a “frota fantasma”

O termo, usado por especialistas e autoridades ocidentais, designa um conjunto de navios-tanque que adotam manobras para ocultar proprietários e rotas. Muitos desligam o AIS (sistema automático de identificação), operam sem seguros adequados e navegam sob bandeiras de conveniência. Estima-se que Moscou tenha reunido entre 500 e 600 petroleiros desde 2022, grande parte em mau estado de conservação.

O Brasil como porto seguro

Como não aderiu às sanções internacionais, o Brasil se tornou destino estratégico. De fevereiro de 2022 a julho de 2025, 36 navios da frota fantasma atracaram em portos brasileiros, representando 17% de todo o combustível importado da Rússia no período. Os principais pontos de desembarque são os portos de Santos e Paranaguá.

A Rússia responde hoje por 60% de todo o diesel importado pelo Brasil, consolidando-se como principal fornecedor desde 2023.

Riscos e consequências

Os especialistas ouvidos pela BBC alertam para riscos ambientais, diplomáticos e econômicos.

- Ambientais: acidentes seriam difíceis de responsabilizar, já que os navios são antigos, pouco rastreáveis e sem seguros completos. O professor Alexander Turra (USP) lembra do vazamento de petróleo de 2019, jamais atribuído oficialmente a uma embarcação.

- Diplomáticos: segundo Benjamin Schmitt, da Universidade da Pensilvânia, “qualquer empresa que estiver fazendo negócios com essas embarcações trazendo combustíveis da Rússia está financiando a invasão ilegal da Rússia”. O pesquisador alerta que o Brasil pode se tornar alvo de sanções, como ocorreu recentemente com a Índia.

Bolsonaro, Lula e a continuidade da política

A investigação mostra que o primeiro navio da frota fantasma atracou no Brasil em agosto de 2022, ainda no governo Bolsonaro, que estimulou a importação de diesel russo como forma de conter preços em ano eleitoral.

O petroleiro NS Pride, citado por Bolsonaro em rede social como símbolo da chegada de diesel barato, acabou sendo incluído em sanções internacionais meses depois.

Sob o governo Lula, o fluxo aumentou: das 36 embarcações, 29 chegaram ao Brasil a partir de 2023. O atual presidente também não aderiu às sanções e, em visita a Moscou, destacou a importância do combustível russo: “A Rússia é um parceiro importante para nós na questão de óleo, de gás e de pequenos reatores nucleares”, afirmou Lula ao lado de Putin.

Falta de restrições oficiais

Segundo a apuração, órgãos como a Antaq, Marinha e Polícia Federal confirmaram que nunca receberam orientações para impedir a entrada desses navios. Já o Palácio do Planalto e a embaixada russa não responderam aos questionamentos da reportagem.

Uma conta que pode chegar ao Brasil

Com portos recebendo embarcações já sancionadas e um comércio bilionário em expansão, especialistas alertam: a posição brasileira pode atrair futuras medidas punitivas dos EUA e aliados.

Em 2022, o Brasil comprou US$ 100 milhões em combustíveis russos. Em 2023, o valor saltou para US$ 4,5 bilhões; em 2024, chegou a US$ 5,4 bilhões; e em 2025, até julho, já soma US$ 3,07 bilhões.

Autor(a): BZN



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